segunda-feira, 18 de novembro de 2013

SOBRE PROFESSORES...

"Os professores não falham nunca por ignorância.
Isto é sabido por experiência profissional.
Os professores falham quando não conseguem "manobrar a classe".
A verdadeira educação deve limitar-se, exclusivamente, aos homens que INSISTEM em conhecer, o resto é pastoreio de ovelhas"

domingo, 27 de outubro de 2013

CRIANÇA PETISCANDO

Na fresta do guarda-comida entreaberto penetra sua mão, como um amante através da noite. Quando então, na escuridão, ela se sente em casa, tateia em busca de açúcar ou amêndoas, de uvas passas ou frutas em conserva. E assim como o amante, antes de beijá-la, abraça sua amada, assim o tato tem com eles um encontro marcado, antes que a boca prove sua doçura. Como se entrega o mel, como se entregam os cachos de passas de Corinto, como até mesmo o arroz se entrega lisonjeiramente à mão. Que apaixonado esse encontro dos dois, que agora enfim escaparam da colher. Grata e selvagem, como uma moça que foi raptada da casa dos pais, a compota de morango se dá a saborear aqui sem pãezinhos e, por assim dizer, sob o livre céu de Deus, e até mesmo a manteiga responde com ternura à ousadia de seu conquistador, que penetrou de assalto em seu quarto de donzela. A mão, Don Juan juvenil, logo penetrou em todas as celas e aposentos, deixando para trás camadas que escorrem e massas que fluem: donzelice que se renova sem queixa.


O trecho acima é do livro Rua de Mão Única, de Walter Benjamim.

KIM TCHUN-SU

 Flor


Antes de eu pronunciar o nome
ele não era
mais que um simples gesto

Quando eu lhe pronunciei o nome
ele veio a mim
e se tornou uma flor

Assim como chamei-lhe o nome
alguém me chama o nome
que combine com o meu nariz e o meu perfume

Também quero ir até ele
e tornar-me a sua flor
Todos nós queremos ser algo
Eu para você, você para mim
Queremos ser
um inesquecível
significado

NAMGUNG BYÓK

Dor da Estrelas


Querida, minha querida, quando
o bebê revira o corpo na cama
nunca te ocorreu, involuntariamente,
levar um grande susto?

Querida, minha querida, quando
as pessoas do mundo torcem e arrancam as flores da terra,
nunca te ocorreu que as estrelas do céu se contorcem de dor?

CORÉIA: UM PAÍS QUE SE CHAMA DANÇA por paulo leminski


CORÉIA: UM PAÍS QUE SE CHAMA DANÇA


     E a devoração brasileira da poesia do planeta, via tradução, prossegue. Agora um ramo de flores, iluminado, vindo do “País da Serenidade Matutina, pelas mãos doces de Yun Jung Im, estudiosa coreano-brasileira, atualmente em Seul, de onda manda uma carta, através do irmão me convidando para participar desta bonita festa de poemas doloridos e ternos, densos e melancólicos.
     Esta antologia (antologia”, em grego, quer dizer escolha de flores) marca a chegada da poesia coreana entre nós, ampliando, no ano das Olimpíadas de Seul (encontro helênico-coreano), nosso conhecimento das artes do Extremo Oriente.
     Da China, já conhecíamos várias coisas, através das transcriações do original, por obra e graça de Haroldo de Campos ou através de traduções de Ezra Pound, entre outros.
     A poesia japonesa, através dos haikais, já é presença na poesia brasileira desde o Modernismo.
     A poesia coreana traz, a fogo, a marca do povo que a produziu, um povo sofrido de mil guerras e mil invasões, imprensado entre a China e o Japão, por eles invadido e oprimido. Nesse sentido, a condição nacional do povo coreano lembra demais a situação da Polônia na Europa, nação orgulhosa sempre espremida entre os alemães de um lado e os russos do outro.
     Como os poloneses, os coreanos tiveram muito que lutar para preservar sua personalidade nacional e seus valores culturais.
     Assim como a língua polonesa foi proibida por dominadores prusssianos e russos, a língua coreana chegou a ser proscrita pelos invasores japoneses.
     Mas, como a Polônia e o povo polonês, a Coréia e o povo coreano sobreviveram e hoje estão presentes aqui no Brasil em contingentes imigratórios significativos, entrando a fazer parte, a partir de agora, deste carnaval de raças que, um dia, vai ser o povo brasileiro.
     Na poesia coreana do século XX, objeto deste livro, me chama a atenção a finura de percepção, a delicadeza de certos registros e uma espécie de doce melancolia que impregna tudo.
     E, sobretudo, a presença de um grande poeta, a revelação do livro para mim, desde já o meu poeta coreano moderno, o boêmio e surrealista Yi Sang, com poemas experimentais surpreendentes.
     “Coreó”, o nome antigo da Coréia, significa Alta Beleza”.
   Pelo Aurélio, significa “Dança”. Feliz coincidência. E nessa dança, estamos desde já.

Paulo Leminski
(junho de 1988)

sábado, 26 de outubro de 2013

T. S. ELIOT (1888 - 1965)




A TERRA DESOLADA

O ENTERRO DOS MORTOS (um trecho)

Abril é o mais cruel dos meses, germina
Lilases da terra morta, mistura
Memória e desejo, aviva
Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O verão; nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E ao sol caminhamos pelas aléias de Hofgarten,
Tomamos café, e por uma hora conversamos.
Big gar keine Russin, stamm' aus Litauen, echt deutsch.
Quando éramos crianças, na casa do arquiduque,
Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó.
E eu tive medo. Disse-me ele, Maria,
Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos.
Nas montanhas, lá, onde livre te sentes.
Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno.
Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham
Nessa imundície pedregosa? Filho do homem,
Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces
Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol,
E as árvores mortas já não mais te abrigam,
nem te consola o canto dos grilos,
E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas
Uma sombra medra sob esta rocha escarlate.
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),
E vou mostrar-te algo distinto
De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece
Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó.

(Tradução de IVAN JUNQUEIRA.)

CHARLES BUKOWSKY (1920 - 1994)



há um pássaro azul no meu peito
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica aí dentro,
não vou deixar
ninguém ver-te
há um pássaro azul no meu peito
que quer sair
mas eu despejo whisky para cima dele
e inalo fumos de cigarros
e as putas e os empregados de bar
e os funcionários da mercearia
nunca saberão
que ele se encontra
lá dentro.
há um pássaro azul no meu peito
que quer sair
mas eu sou demasiado duro para ele,
e digo, fica escondido
queres arruinar-me?
queres foder-me o
meu trabalho?
queres arruinar
as minhas vendas de livros
na Europa?
há um pássaro azul no meu peito
que quer sair
mas eu sou demasiado esperto,
só o deixo sair à noite
por vezes
quando todos estão a dormir
digo-lhe, eu sei que estás aí,
por isso
não estejas triste.
depois, coloco-o de volta,
mas ele canta um pouco lá dentro,
não o deixei morrer de todo
e dormimos juntos
assim
com o nosso
pacto secreto
e é bom o suficiente
para fazer um homem chorar,
mas eu não choro,
e tu?

EZRA POUND (1885 - 1972)

                                                          "O mau crítico se identifica facilmente quando começa a discutir o poeta e não o poema."



CANTO 6

O que fizeste, Odisseu,
     Sabemos o que fizeste...
E que Guillaume liquidou as rendas de suas terras
(Sétimo de Poitiers, Nono de Aquitânia).
     "Tant las fotei com auzirets
     Cen e quatre vingt et veit vetz..."
A pedra é viva em minha mãe. Fartas
     colheitas no ano de minha morte...
Até que Louis desposou Eleonora
E teve (Ele, Guillaume) um filho que desposou
A Duquesa de Normandia cuja filha
Foi mulher do rei Henrique e maire del rei jove...
Navegaram até o fim do dia (Ele, Louis, com Eleonora)
E foram dar no Acre.
"Ongla, oncle" disse Arnaut,
     O tio comandava em Acre,
Que a conhecera ainda menina
     (Teseu, filho de Egeu)
E ele, Louis, não se dava bem nessa cidade,
Nem às margens do Jordão
Quando ele cavalgava até o renque de Palmeiras
Seu lenço no elmo de Saldino.
Divorciou-se dela naquele ano, ele Louis,
     divorciando-se de Aquitânia.
E naquele ano o Plantageneta a desposou
     (passando a perna em 17 pretendentes)
Et quand lo reis Lois lo entendit
     mout er fasché.
Nauphal, Vexis, Harry joven
Em usufruto para si e seus herdeiros
Terá Gisors, e Vexis, Neufchastel
Mas na falta da prole Gisors reverterá...
"Não precisa casar-se com Alix... em nome
Da santa Trindade indivisível... Ricardo nosso irmão
Não precisa casar-se com Alix, outrora pupila de seu pai... mas
Com quem escolher... pois Alix, etc...

(Tradução conjunta de AUGUSTO DE CAMPOS, DÉCIO PIGNATARI E HAROLDO DE CAMPOS)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

ADAM FILHO DE CÃO de YORAM KANIUK

Da série "O que estou lendo agora?" ou "DOS CUIDADOS DE SI -  porque uma pessoa é o que come o seu corpo, mas também o que devora a sua alma -", quero compartilhar, como um prato forte e exótico, desses de matar a fome de algum jejum estranho, a leitura de YORAM KANIUK, Adam filho de cão; tradução de Nancy Rozenchan, SP: Ed. Globo, 2003
 
A tópica da loucura acompanha essa insana que vos fala desde muito jovem. Já não me lembro quando li O Alienista, de Machado de Assis, e aquele doutor Simão Bacamarte entrou pelos quatro contos do meu corpo. Contos mesmo, não é um erro ortográfico, senão seria uma solução. E eu não quero explicar nada. Já temos explicações demais à nossa volta. Racionalizar em tempos como os nossos, já percebeu o cinema, é perda de tempo. Não vale um nihil! Todos queremos é fantasia. A fantasia de não ser homem. A delícia sem culpa, como se permite a um deus, de ser super, hiper, mega, plus, ultra ex-man. Adam Stein é um desses. Entrou na minha vida essa semana, a última de um fevereiro chuvoso, com tempestades de vento, trovoadas e raios, muitos raios, nessa cidade com nome de santo, nem pescador, nem cristão, um perseguidor atingido. Se um raio me atingir e me der super poderes deixarei de perseguir o que quer que seja e serei o que tiver que ser. Estamos no ano de 2013, do século XXI, e não há nada mais bizarro do que ser brasileira. Mas, hoje, Adam Stein está junto comigo nessa empreitada. Eu começo a vislumbrar quem eu sou. A descrição que me fez dele o Dr Gross, discípulo de Freud, vale por uma apresentação. Vou citá-la e fim de papo por hora:
 
"Tudo o que Adam Stein faz causa-lhes espanto. Ele sabe disso e faz tudo a fim de manter a fama. Dr Gross, que agora o aguarda no gabinete, chama Adam de "gênio", e dr. Gross não usa as palavras em vão. Pois Adam Stein foi privilegiado com talentos incomuns dos quais ele absolutamente não se vangloria. Sua beleza e riqueza, por exemplo, são-lhe mais importantes. O fato de, após a guerra, Herr Kommandant ter-lhe devolvido todo o seu dinheiro e tê-lo conduzido de volta a Berlim era, a seu ver, mais significativo do que o espantodo dr. Gross, diretor do Instituto de Repouso e Terapia, sobre sua cpacidade de ler livros fechados, conversar com pessoas que se encontravam a uma grande distancia ou saber a história de objetos pelo tato.
 
Poucos anos atrás, antes da fundação do Instituto da sra. Zisling, quando o hospital ainda se localizava em Jafa, e fora trazido peloa primeira vez ao dr. Gross, Adam reparara num belo sabre árabe pendurado na parede, junto ao retrato do dr. Freud numa moldura dourada. O lindo sabre, feito de metal prateado e enfeitado de borlas coloridas, excitou-o pela aparência nobre, selvagem, que lembrava deserto, e ele estendeu a mão e começou a apalpá-lo.
 
O dr. Gross jamais esqueceria ter permanecido sentado, observando Adam cujos olhos estavam fechados e parecia perturbado pelas forças ocultas desconhecidas, invisíveis, incompreensíveis que penetravam no espaço. Adam apalpou a arma e suas mãos como que contavam a história despejando pela boca as palavras e os nomes sem parar: Uja al-Khafir, El-Arish, uma rua numa cidade branca, praia, uma mesquita com um café ao lado e subitamente um tumulto, barulho, e dois árabes brigando, e de repente Adam grita dirigindo-se ao dr. Gross: "O dono do sabre matou o homem errado!" O médico empalideceu, respirou fundo e esperou, e Adam passeou pelo Oriente e chegou a Aden, ao principado do Golfo Pérsico, a Birodjan, às montanhas prateadas, às montanhas da própria Pérsia. De repente, gritou em inglês: "O sultão está morto, viva o rei, Sua Majestade George V"! O pai do dr. Gross servira no exército turco e em 1915 alistara-se na polícia britânica, chegara ao posto de oficial e passara por todos aqueles lugares.
 
O dr. Gross sorriu prazerosamente. De repente Adam pára, range os dentes, e seus olhos passeiam em volta. O que aconteceu? Alguma coisa o bloqueava, uma palavra estava presa em sua garganta e recusava-se a sair. Era uma provação, causa-lhe sofrimento até que consegue: "Ruth. Não sei por quê, mas o nome que desejo pronunciar é Ruth"."O que aconteceu, Adam?" Arrancado dos desertos fanáticos o dr. Gross voltou ao gabinete, e o retrato do dr. Freud devolveu-lhe a frieza perene, que não compactuava com o universo primitivo dissimulado na mente dos pacientes: "O que foi que aconteceu, Adam?"
 
"Não sei", disse Adam. "Ruth era o nome da minha filha. Vim procurá-la aqui, você sabe, não? Foi a ela que eu traí. Mas este sabre é seu e o que é que tem a ver com a minha filha?" O dr. Gross não compreende. Está sedento por aquele rio forte e tempestuoso que jorra do coração de Adam e lhe transmite uma informação antiga e gloriosa. Não, aparentemente não há nenhuma relação. Quem foi Ruth? O dr. Gross rebusca o pensamento e não descobre. Mais tarde vem a saber pela mãe que o pai, antes de se casar com ela, tinha sido casado com uma inglesa, a srta. Jeanne Parker, que viera para Israel com uma delegação de arqueólogos ingleses, fizeram escavações perto de Jenin, apaixonara-se pelo jovem Gross e depois se casara com ele. Os anciões da cidade chamavam-na Ruth, em homenagem a Ruth, a moabita, e, pelas costas, irados, meneavam as cabeças dizendo: "Gross alistou-se no exército turco, passou a usar um barrete turco e casou-se com uma mulher não-judia." Ela cansou-se dos murmúrios, fugiu para Londres e, então, Gross pai casou-se com quem dera à luz o dr. Gross. O sabre, contou-lhe sua mãe com os olhos vermelhos de saudades e da ferida que nunca cicatrizara, fora presente daquela Ruth, a não-judia."

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Yoane, Cuba e Capitalismo

Grande mídia brasileira não fará nenhum questionamento a Yoani Sánchez que esteja fora dos padrões de conveniências (Foto: aBr)


40 perguntas para Yoani Sánchez em sua turnê mundial: famosa opositora cubana fará seu giro global por mais de uma dezena de países do mundo
1. Quem organiza e financia sua turnê mundial?
 
2. Em agosto de 2002, depois de se casar com o cidadão alemão chamado Karl G., abandonou Cuba, “uma imensa prisão com muros ideológicos”, para imigrar para a Suíça, uma das nações mais ricas do mundo. Contrariamente a qualquer expectativa, em 2004, decidiu voltar a Cuba, “barco furado prestes a afundar”, onde “seres das sombras, que como vampiros se alimentam de nossa alegria humana, nos introduzem o medo através do golpe, da ameaça, da chantagem”, onde “os bolsos se esvaziavam, a frustração crescia e o medo se estabelecia”. Que razões motivaram esta escolha?
 
 
3. Segundo os arquivos dos serviços diplomáticos cubanos de Berna, Suíça, e de serviços migratórios da ilha, você pediu para voltar a Cuba por dificuldades econômicas com as quais se deparou na Suíça. É verdade?
 
4. Como pôde se casar com Karl G. se já estava casada com seu atual marido Reinaldo Escobar?

 
5. Ainda é seu objetivo estabelecer um “capitalismo sui generis” em Cuba?

 

6. Você criou seu blog Geração y (Generación Y) em 2007. Em 4 de abril de 2008 conseguiu o Prêmio de Jornalismo Ortega e Gasset, de 15 mil euros, outorgado pelo jornal espanhol El País. Geralmente, este prêmio é dado a jornalistas prestigiados ou a escritores de grande carreira literária. É a primeira vez que uma pessoa com seu perfil o recebe. Você foi selecionada entre cem pessoas mais influentes do mundo pela revista Time (2008). Seu blog foi incluído na lista dos 25 melhores blogs do mundo pela cadeia CNN e pela revista Time (2008), e também conquistou o prêmio espanhol Bitacoras.com, assim como The Bob’s (2008). El País lhe incluiu em sua lista das cem personalidades hispano-americanas mais influentes do ano 2008. A revista Foreign Policy ainda a incluiu entre os dez intelectuais mais importantes do ano em dezembro de 2008. A revista mexicana Gato Pardo fez o mesmo em 2008. A prestigiosa universidade norte-americana de Columbia lhe concedeu o prêmio María Moors Cabot. Como você explica esta avalanche de prêmios, acompanhados de importantes quantias financeiras, em apenas um ano de existência?
 
7. Em que emprega os 250 mil euros conseguidos graças a estas recompensas, um valor equivalente a mais de 20 anos de salário mínimo em um país como França, quinta potencia mundial, e a 1.488 anos de salário mínimo em Cuba?
 
8. A Sociedade Interamericana de Imprensa, que agrupa os grandes conglomerados midiáticos privados do continente, decidiu nomeá-la vice-presidente regional por Cuba de sua Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação. Qual é seu salário mensal por este cargo?
 

9. Você também é correspondente do jornal espanhol El País. Qual é sua remuneração mensal?
10. Quantas entradas de cinema, de teatro, quantos livros, meses de aluguel ou pizzas pode pagar em Cuba com sua renda mensal?
11. Como pode pretender representar os cubanos enquanto possui um nível de vida que nenhuma pessoa na ilha pode se permitir levar?
12. O que faz para se conectar à Internet se afirma que os cubanos não têm acesso e ela?
13. Como é possível que seu blog possa usar Paypal, sistema de pagamento online que nenhum cubano que vive em Cuba pode utilizar por conta das sanções econômicas que proíbem, entre outros, o comércio eletrônico?
14. Como pôde dispor de um Copyright para seu blog “© 2009 Generación Y – All Rights Reserved”, enquanto nenhum outro blogueiro cubano pode fazer o mesmo por causa das leis do embargo?
15. Quem se esconde atrás de seu site desdecuba.net, cujo servidor está hospedado na Alemanha pela empresa Cronos AG Regensburg, registrado sob o nome de Josef Biechele, que hospeda também sites de extrema direita?
16. Como pôde fazer seu registro de domínio por meio da empresa norte-americana GoDady, já que isto está formalmente proibido pela legislação sobre as sanções econômicas?
17. Seu blog está disponível em pelo menos 18 idiomas (inglês, francês, espanhol, italiano, alemão, português, russo, esloveno, polaco, chinês, japonês, lituano, checo, búlgaro, holandês, finlandês, húngaro, coreano e grego). Nenhum outro site do mundo, inclusive das mais importantes instituições internacionais, como por exemplo as Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a OCDE ou a União Europeia, dispõem de tantas versões linguísticas. Nem o site do Departamento de Estado dos Estados Unidos, nem o da CIA dispõem de igual variedade. Quem financia as traduções?
18. Como é possível que o site que hospeda seu blog disponha de uma banda com capacidade 60 vezes superior àquela que Cuba dispõe para todos os usuários de Internet?
19. Quem paga a gestão do fluxo de mais de 14 milhões de visitas mensais?
20. Você possui mais de 400 mil seguidores em sua conta no Twitter. Apenas uma centena deles reside em Cuba. Você segue mais de 80 mil pessoas. Você afirma “Twitto por sms sem acesso à web”. Como pode seguir mais de 80 mil pessoas sem ter acesso à internet?

21. O site www.followerwonk.com permite analisar o perfil dos seguidores de qualquer membro da rede social Twitter. Revela a partir de 2010 uma impressionante atividade de sua conta. A partir de junho de 2010, você se inscreveu em mais de 200 contas diferentes do Twitter a cada dia, com picos que podiam alcançar 700 contas em 24 horas. Como pôde realizar tal proeza?

22. Por que cerca de seus 50 mil seguidores são na verdade contas fantasmas ou inativas? (ver aqui) De fato, dos mais de 400 mil perfis da conta @yoanisanchez, 27.012 são ovos (sem foto) e 20 mil têm características de contas fantasmas com uma atividade inexistente na rede (de zero a três mensagens mandadas desde a criação da conta).

23. Como é possível que muitas contas do Twitter não tenham nenhum seguidor, apenas seguem você e tenham emitido mais de duas mil mensagens? Por acaso seria para criar uma popularidade fictícia? Quem financiou a criação de contas fictícias?
24. Em 2011, você publicou 400 mensagens por mês. O preço de uma mensagem em Cuba é de 1,25 dólares. Você gastou seis mil dólares por ano com o uso do Twitter. Quem paga por isso?
25. Como é possível que o presidente Obama tenha lhe concedido uma entrevista, enquanto recebe centenas de pedidos dos mais importantes meios de comunicação do mundo?
26. Você afirmou publicamente que enviou ao presidente Raúl Castro um pedido de entrevista depois das respostas de Barack Obama. No entanto, um documento oficial do chefe da diplomacia norte-americana em Cuba, Jonathan D. Farrar, afirma que você nunca escreveu a Raúl Castro: “Ela não esperava uma resposta dele, pois confessou nunca tê-las enviado [as perguntas] ao presidente cubano. Por que mentiu?

27. Por que você, tão expressiva em seu blog, oculta seus encontros com diplomáticos norte-americanos em Havana?

28. Entre 16 e 22 de setembro de 2010, você se reuniu secretamente em seu apartamento com a subsecretaria de Estado norte-americana Bisa Williams durante sua visita a Cuba, como revelam os documentos do Wikileaks. Por que manteve um manto de silêncio sobre este encontro? De que falaram?

29. Michael Parmly, antigo chefe da diplomacia norte-americana em Havana afirma que se reunia regularmente com você em sua casa, como indicam documentos confidenciais da SINA. Em uma entrevista, ele compartilhou sua preocupação em relação à publicação dos cabos diplomáticos norte-americanos pelo Wikileaks: “Eu me incomodaria muito se as numerosas conversas que tive com Yoani Sánchez forem publicadas. Ela poderia sofrer as consequências por toda a vida”. A pergunta que imediatamente vem à mente é a seguinte: quais são as razões por que você teria problemas com a justiça cubana se sua atuação, conforme afirma, respeita o marco da legalidade?

30. Continua pensando que “muitos escritores latino-americanos mereciam o Prêmio Nobel de Literatura mais que Gabriel García Márquez”?

31. Continua pensando que “havia uma liberdade de imprensa plural e aberta, programas de rádio de toda tendência política” sob a ditadura de Fulgencio Batista entre 1952 e 1958?

32. Você declarou em 2010: “o bloqueio tem sido o argumento perfeito do governo cubano para manter a intolerância, o controle e a repressão interna. Se amanhã as suspenderem as sanções, duvido muito que sejam vistos os efeito”. Continua convencida de que as sanções econômicas não têm nenhum efeito na população cubana?
33. Condena a imposição de sanções econômicas dos Estados Unidos contra Cuba?
34. Condena a política dos Estados Unidos que busca uma mudança de regime em Cuba em nome da democracia, enquanto apoio as piores ditaduras do Oriente Médio?
35. Está a favor da extradição de Luis Posada Carriles, exilado cubano e ex-agente da CIA, responsável por mais de uma centena de assassinatos, que reconheceu publicamente seus crimes e que vive livremente em Miami graças à proteção de Washington?
36. Está a favor da devolução da base naval de Guantánamo que os Estados Unidos ocupam?
37. Você é favorável à libertação dos cinco presos políticos cubanos presos nos Estados Unidos desde 1998 por se infiltrarem em organizações terroristas do exílio cubano na Florida?
38. Em sua opinião, é normal que os Estados Unidos financiem uma oposição interna em Cuba para conseguir “uma mudança de regime”?

39. Em sua avaliação, quais são as conquistas da Revolução Cubana?

40. Quais interesses se escondem atrás de sua pessoa?


 

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

AMOR E MORTE - De Catulo a John Donne


AULA INAUGURAL 2013
REDAÇÃO / Professora LUCIANA
 
            Meus caros alunos,
 
Com muito entusiasmo inauguro o curso de Redação 2013 do Liceu de Artes e Ofício de São Paulo propondo-lhes uma reflexão em torno de duas tópicas - temas recorrentes na arte de todos os tempos: o amor e a morte.
A morte, esse assunto pouco usual para o começo de um ano letivo, está aqui em razão dos acontecimentos recentes que chocaram toda a população do Brasil, em Santa Maria, RS. Diante da dor do outro temos que nos colocar sempre. Mas que cada notícia dada, cada reflexão feita sobre essa dor seja para solidarizar primeiro e transformar logo em seguida. De nada adianta a noticia sobre uma tragédia que não traga em si o germe para a mudança e a prevenção. Ao longo do ano, em nosso curso sobre a prática da leitura e da escrita, gradativamente vamos preparar vocês para que sejam capazes de se posicionar diante do que for, no dia a dia, como pessoa consciente e atuante do seu papel cidadão, sabendo ler, compreender e intervir por meio da palavra, essa poderosa arma.
A outra tópica, sobre o amor, é necessária pelas razões óbvias. Bem pouco na vida se faz sem ele. É o melhor remédio contra a dor, principalmente a da morte. É o nosso combustível diário, a força que move o nosso desejo e alimenta a nossa vontade. E é sempre muito estimulante, e catalizador de potencialidades, iniciar qualquer coisa que seja em nome dele, do amor.
Posto isso, vamos aos textos e seus autores:
 


 I. John Donne é um dos maiores poetas de língua inglesa que conheço. Incompreendido na sua época, o século XVII, foi esquecido por muito tempo, mas é hoje reverenciado e lido em todo o mundo. Sua obra serviu de inspiração para muitos outros poetas além da sua época. Foi a partir do texto de John Donne, selecionado abaixo, que o escritor norte-americano Ernest Hemingway encontrou inspiração para o título do seu romance “Por Quem os Sinos Dobram”. Também a FUVEST já explorou no seu vestibular o mote, destacado do texto de Donne, “Nenhum homem é uma ilha”.


POR QUEM OS SINOS DOBRAM?
Nunc lento sonitu dicunt, morieri (*)
“Talvez aquele para quem estes sinos dobram esteja tão mal que ele sequer sabe que dobram por ele. E talvez eu possa me achar muito melhor do que sou, como fazem aqueles que me rodeiam, e ao ver o meu estado podem tê-lo feito dobrar por mim, e eu nem saiba disso. (...) E quando a Igreja enterra um homem, esta ação também me diz respeito; toda a humanidade provém de um autor, e forma um único livro; quando um homem morre, um capítulo não é arrancado do livro mas traduzido para uma linguagem melhor, e cada capítulo deve ser assim traduzido; Deus emprega inúmeros tradutores; algumas peças são traduzidas pela idade, algumas pela doença, algumas pela guerra, algumas pela justiça, mas a mão de Deus está em cada tradução, e sua mão reunirá outra vez todas as nossas folhas espalhadas formando a biblioteca onde cada livro deverá permanecer aberto aos outros, da mesma maneira que, quando o sino toca chamando para o sermão, não chama apenas o pregador, mas também toda a congregação; nos chama a todos, e ainda mais a mim, a quem a doença pôs às portas da morte.
Houve uma disputa e mesmo um processo (onde se misturaram piedade e dignidade, religião e opinião) sobre qual ordem religiosa deveria tocar primeiro chamando para as orações no início da manhã, e foi determinado que tocaria primeiro aquela que acordou mais cedo. Se entendermos bem a dignidade deste sino, dessas badaladas para a nossa oração da noite, ficaríamos felizes tornando-as nossas, madrugando, nessa aplicação, que poderia ser nossa e também sua, como de fato é. O sino toca por ele, e pelas coisas que fez; e embora intermitente, ainda nesse minuto, como no momento em que tocou sobre ele, ele já está unido a Deus. Quem não levanta seu olhar para o sol quando ele nasce? Quem tira o olho de um cometa quando irrompe no céu? Quem não presta ouvidos ao badalar de um sino, qualquer que seja o motivo dessas badaladas? Mas quem de nós pode distraí-los daquele sino no momento em que um pedaço de nós mesmos está passando para fora deste mundo?
Nenhum homem é uma ilha, completa em si mesma; todo homem é um pedaço do continente, uma parte da terra firme. Se um torrão de terra for levado pelo mar, a Europa fica menor, como se tivesse perdido um promontório, ou perdido a morada de um amigo teu, ou a tua própria morada. A morte de qualquer homem me deixa diminuído, porque na humanidade me encontro envolvido; por isso, nunca mandes perguntar por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”                 
(Tradução de José Carlos Ruy)              
Nota do tradutor: (*) Os sinos tocam suavemente por alguém. E me dizem: você também vai morrer
 
 
II.

Catulo, poeta romano que viveu entre os anos de 84 e 54 antes de Cristo, apresenta uma obra poética marcada pela sofisticação e irreverência. Dono de uma sintaxe chamada de incomum, utilizava frases cortadas, repetições e versos ligeiros; utilizava, ainda no âmbito da linguagem, expressões e palavras coloquiais. Sua tradição literária está ligada aos poetas alexandrinos, em que relatava, nesse tipo de versos, seus sentimentos pessoais. Com uma poesia de amor elegante e sincera, ele foi o iniciador da lírica erótica em Roma. Sua obra é composta, ainda, de mais de cem poemas, em que uma grande parte foi dedicada à paixão que sentia por Lésbia, mulher a quem seu coração pertencia.

 

 

 

 

 

CATULO (85 a.C. – 54 a.C.),Vivamos, minha Lésbia, e amemos”

 

“Vivamos, minha Lésbia, e amemos

e as graves vozes velhas

- todas –

valham para nós menos que um vintém.

Os sóis podem morrer e renascer;

Mas nós, quando se apaga nosso fogo breve

dormimos uma noite infinita.

Dá-me pois mil beijos, e mais cem,

e mil, e cem, e mil, e mil e cem.

Quando somarmos muitas vezes mil

misturaremos tudo até perder a conta:

que a inveja não ponha o olho de agouro

no assombro de uma tal soma de beijos.”

(Tradução de Haroldo de Campos)

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

POR QUEM OS PODEROSOS OLHAM?


POR QUEM OS PODEROSOS OLHAM?

Juventude e Segurança Pública: uma questão de classe social?

       Santa Maria chora por seus filhos! E eu, que choro em consonância com ela, lembrei-me de um texto de John Donne, poeta inglês do século XVII, “Por quem os sinos dobram?”, ou, talvez, “Nenhum homem é uma ilha”. Quando se enterra um homem, diz o poeta, “esta ação também me diz respeito; toda a humanidade provém de um autor, e forma um único livro; quando um homem morre, um capítulo não é arrancado do livro, mas traduzido para uma linguagem melhor, e cada capítulo deve ser assim traduzido; Deus emprega inúmeros tradutores; algumas peças são traduzidas pela idade, algumas pela doença, algumas pela guerra, algumas pela justiça, mas a mão de Deus está em cada tradução, e sua mão reunirá outra vez todas as nossas folhas espalhadas formando a biblioteca onde cada livro deverá permanecer aberto aos outros, da mesma maneira que, quando o sino toca chamando para o sermão, não chama apenas o pregador, mas também toda a congregação; nos chama a todos. Nenhum homem é uma ilha, completa em si mesma; todo homem é um pedaço do continente, uma parte da terra firme; a morte de qualquer semelhante deixa-me diminuído, porque eu estou integrado no gênero humano, e por isso, nunca mandes saber por quem os sinos dobram; os sinos dobram por ti”.  

Diante da dor do outro, como não me sentir diminuída também? Como não chorar junto? Como não me revoltar e, inconsolável, querer, agora que a tragédia se fez carne, e nome, 235 nomes de jovens mortos até o momento desse texto, mais a dor as famílias desses jovens, dos amigos, dos namorados e namoradas, do país inteiro, sim, nós brasileiros, todos, juntos, solidários, queremos agora ser cidadãos. Queremos participar das fiscalizações das boates da nossa cidade, queremos que o poder público ofereça mais segurança aos nossos jovens.

Opa, segurança, jovens! Mas de quais jovens estamos falando?

Recentemente, em uma avaliação do governo do estado São Paulo aplicada nas escolas públicas para jovens terminando o terceiro ano do Ensino Médio, também foi proposta, pelo próprio governo, uma questão parecida, envolvendo jovem e segurança pública. Só que para o governo, os jovens de que ele tratava, quase todos pobres, quase todos negros, quase todos da periferia, quase todos sem perspectiva alguma de continuar os seus estudos e entrar numa Universidade Pública, ou festejar com amigos e parentes em uma casa noturna a nova etapa da sua vida, esses jovens, semelhantes aos outros apenas no gênero humano, é que ofereciam perigo à segurança do Brasil e deveriam, cada vez mais cedo, cada vez mais jovens, 18 anos é muito, 16, talvez 12, quem sabe com 7 ou 8 anos já deveriam ser considerados responsáveis para poder apodrecer nas prisões de nosso sistema penitenciário.

Eu, que também sou mãe, coloco-me no lugar, todos os dias, também dessas mães quase sempre negras, quase sempre pobres, quase sempre com pouca escolaridade, que perde um filho jovem todo dia para o crime, as drogas ou os conflitos armados com traficantes e com a polícia. Quantos serão? Ninguém conta!

Verdade, eles não morrem todos ao mesmo tempo, o que seria, sem dúvida, muito mais dramático. Mas são muitos também. E a morte deles não acontece uma única vez e nem em um único lugar. Acontece sempre e se espalha por todas as cidades desse nosso país. Mães choram o tempo todo pela vida ceifada antes da hora de seus filhos. Isso aqui é tão comum! Ontem, hoje, agora, no momento em que você lê esse texto, jovens morrem por falta de uma política pública de segurança, por falta de uma política pública de prevenção a qualquer dano que possa ir contra a sua integridade física.

Que as 235 almas jovens de Santa Cruz, no Rio Grande do Sul, sem classe e sem cor agora, sejam um farol a iluminar nossos dirigentes para a questão da segurança pública de nossos jovens. De todos eles, sem distinção!



O número de jovens vítimas de homicídios no Espírito Santo chegou a 391 de janeiro a maio deste ano, segundo dados da Secretaria de Estado da Segurança. Levantamento do Núcleo de Estudos sobre Violência, Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) apontam que 77% são negros.

Esses dados foram apresentados na noite desta quinta-feira (30) no Plenário Dirceu Cardoso da Assembleia Legislativa (Ales), em sessão especial proposta pelo deputado Claudio Vereza (PT) para debater a “Juventude em Marcha Contra a Violência e Extermínio”. A intenção do parlamentar foi inserir o jovem na discussão, e o Plenário ficou cheio deles.

O presidente do Conselho Estadual dos Direitos Humanos, Gilmar Ferreira de Oliveira, opinou que as políticas voltadas para os jovens não podem ter a “lógica policialesca”, mas serem voltadas para a questão dos direitos humanos e da cidadania. Segundo ele, os jovens querem ser ouvidos para opinar sobre as políticas que querem.

A coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Violência, Segurança Pública e Direitos Humanos da Ufes, professora Eugênia Raizer, foi a palestrante da noite. Mostrou estudo desenvolvido por ela e pela estudante de Serviço Social da Ufes, membro do Núcleo, Silvana Ribeiro da Silva. E começou tentando definir o que é um jovem.

Pensadores tentaram definir o termo juventude, e um brasileiro dividiu em categorias: a juventude dourada (classe alta ou média alta, de cor branca ou amarela), a trabalhadora (50% do total de 15 a 24 anos), os pobres, os vulneráveis (meninos de rua ou de classes baixas que vivem processo de exclusão social nas grandes cidades) e os infratores (pertence a várias camadas sociais e etnias).

A Política Nacional da Juventude considera jovem aquele que tem entre 15 e 29 anos, com subdivisões. Eugênia Raizer mostrou dados que indicam o crescimento do número de homicídios envolvendo jovens no Espírito Santo. Somavam 30,3% em 1998 e chegaram a 38,7% em 2008. Houve crescimento da média nacional, mas o Estado está acima dessa média.

A professora observou que no Espírito Santo o crescimento econômico não se reflete em benefícios sociais, as riquezas não implicam na superação das desigualdades sociais e o mapa da violência segue o das desigualdades. Mostrou um mapa de Vitória onde pontos vermelhos marcavam locais de homicídios em 2008: mais concentrados nas regiões carentes, quase inexistentes nos bairros abastados.

 O Estado ocupa o terceiro lugar no triste ranking dos números de homicídios de jovens no Brasil. Em 2010, na Região Metropolitana da Grande Vitória, os municípios de Serra, Cariacica e Vila Velha tinham o maior número de ocorrências, seguidos de perto por Vitória. Em Viana, Guarapari e Fundão, o número foi bem menor.

De janeiro a maio deste ano, dos 735 assassinatos, 391 foram de jovens, números concentrados na faixa dos 18 aos 24 anos. Somente em abril foram 91 homicídios, cerca de três jovens mortos por dia, lamentou Eugênia Raizer. O número de jovens negros assassinatos gira em torno de 77% do total; 9% são brancos e em 14% dos casos a cor não é informada.

Hildete Emanuelle Nogueira de Souza, membro da coordenação da Campanha Nacional contra a Violência e o Extermínio de Jovens, assegurou que a violência não começa com o disparo de um tiro, mas muito antes, num histórico de exclusão, de racismo, de violência nas escolas, “que ninguém quer falar, ninguém quer debater”. Começa dentro de uma sociedade que vive com medo e “coisifica” o ser humano.

As Pastorais da Juventude do Brasil, ligadas a Igreja Católica, desencadearam a campanha, lembrou, acrescentando que é preciso ultrapassar os muros da igreja e buscar parcerias com movimentos sociais e casas legislativas. Eventos como a sessão desta quinta, que atraiu o secretário municipal de Direitos Humanos de Vitória, João José Barbosa Sana, e a secretária municipal de Assistência Social, Ana Petronetto, bem como o membro da coordenação estadual da campanha, José Luiz Augusto Bedoni.

Fejunes lamenta ausência do Governo na Sessão. O Coordenador do Fórum Estadual de Juventude Negra – Fejunes, Luiz Inácio, criticou a ausência de representantes do Governo no debate. “Infelizmente essa ausência não é pontual, ela se dá em diversos momentos. Existe uma resistência muito grande das autoridades em dialogar sobre esse tema. Enquanto isso dezenas de jovens são exterminados em nosso estado”, enfatizou.

Luiz Inácio ainda cobrou retorno da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social que, segundo ele, até o momento não convidou os articuladores da Campanha para uma nova rodada de conversa a respeito do projeto “Juventude pela Vida” proposto pelas organizações juvenis ao Governo e que visa o protagonismo da juventude no enfrentamento da violência.

“Já faz mais de dois meses que aguardamos retorno da SESP para dialogarmos sobre a implementação de um projeto que visa o envolvimento da juventude no enfrentamento da violência”, disparou.

Os secretários Rodrigo Coelho, da Secretaria Estadual de Direitos Humanos e Assistência Social, e Henrique Herkenhoff, da Secretaria Estadual de Segurança Pública foram convidados, mas não comparecerem.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

DA SABEDORIA POÉTICA: A METÁFORA


Giambattista Vico,  Princípios de (uma) Ciência Nova (acerca da natureza comum das nações), Seleção, tradução e notas do Prof. Antonio Lázaro de Almeida Prado.

 

 

DA SABEDORIA POÉTICA

Corolários a respeito dos tropos, dos monstros mitológicos e das metamorfoses poéticas

 

1.

            Todos os tropos são corolários desta lógica poética. Deles, a mais luminosa e, por mais luminosa, a mais necessária e a mais espessa é a metáfora, que tanto mais louvada se faz quanto às coisas insensatas ela dá sentido e paixão. (...) Pois os primeiros poetas deram aos corpos o grau entitativo de substâncias animadas, capacitadas, no entanto, apenas de quanto lhos pudessem conferir, isto é, de sentido e paixão, e assim deles (sentido e paixão) se fizeram as fábulas. De modo que cada metáfora, assim constituída, vem a ser uma fabulazinha minúscula. Dá-se-nos, pois, esta crítica a respeito do tempo em que nasceram eles nas línguas: que todas as metáforas assumidas com similitudes tomadas aos corpos, de forma a significarem trabalhos de mentes abstratas devem ser dos tempos nos quais começaram a desbastarem-se as filosofias[1]. Demonstramo-lo a partir de um fato: que em toda língua os termos indispensáveis para as artes cultas e para as ciências arcanas têm suas origens aldeãs (contadinesche).

            Isto é digno de nota: que em todas as línguas a maior parte das expressões a respeito de coisas efetuam-se mediante translações do corpo humano e de suas partes, assim como dos sentidos humanos e das humanas paixões. Assim, cabeça, por cimo ou princípio; fronte, espáduas, adiante e atrás; olhos das videiras ou os que chamam os primeiros lumes penetrados nas cascas; boca, toda e qualquer abertura; lábios, bordas de um vaso; dente do arado, do rastelo, da serra, do pente; barbas, as raízes; língua do mar; face ou foz dos rios ou montes;  garganta de terra; braço do rio; mão, por pequeno número; seio do mar, isto é, golfo; flancos ou lados, os cantos; costas do mar; coração por meio (que os latinos chamam de umbilicus); perna ou de países; e por confim; planta por base ou fundamento; carne e ossos dos frutos; veio de água, pedra ou mina; sangue da videira, o vinho; vísceras da terra; ri o mar, o céu; sopra o vento; murmura a onda; geme um corpo sob um grande peso; e os campônios do lácio diziam sitire agros, laborare fructus, luxuriari segetes[2]. Já os nossos camponeses dizem: “amarem-se as plantas, endoidecerem as vides, lacrimejarem os freixos”. E há inumeráveis expressões similares que se podem recolher em todas as línguas.

            Isto acompanha o que referimos naquela Dignidade: que o homem ignorante se faz regra do universo, assim como os exemplos oferecidos ele, a partir de si próprio, erigiu um mundo inteiro. Porque, assim como a metafísica racional ensina que homo intelligendo fit omnia, assim esta metafísica fantástica comprova que homo non intelligendo fit omnia. E talvez mais razoável será dizer isto do que aquilo, pois que o homem com o entender desenvolve a sua mente e compreendo essas coisas, mas com o não entender ele se faz essas coisas, e, com o transformar-se nelas, torna-se elas próprias.

 

2.

            Por força dessa mesma lógica, parto da metafísica, os primeiros poetas devem ter dado às coisas os nomes, a partir das ideias mais particulares e sensíveis. Eis as duas fontes, esta da metonímia e aquela da sinédoque. Daí porque a metonímia dos autores pelas obras nasceu de os autores serem mais nomeados do que as obras; e o dos sujeitos pelas suas formas e adjuntos nasceu porque, como o demonstramos nas Dignidades, não sabiam abstrair dos sujeitos as formas e as qualidades dos mesmos. Certamente a das causas pelos efeitos correspondem a minúsculas fábulas, mediante as quais imaginaram-se serem mulheres vestidas dos seus efeitos, sendo, por isso mesmo, feia a Pobreza, triste a Velhice e pálida a Morte.

 

3.

            A sinédoque passou para transporte depois, como o elevarem-se os particulares a universais ou a comporem-se as partes com as demais com as quais compunham as suas integralidades. “Mortais” chamaram-se propriamente, ao início, tão-somente os homens, únicos a sentirem-se mortais. O “cabeça”, por “homem” ou pela “pessoa”, tão frequente no latim vulgar, porque dentro dos bosques só viam de longe a cabeça do homem. E a palavra “homem” é vocábulo abstrato, que compreende, como em um gênero filosófico, o corpo e todas as partes do corpo, a mente e todas as faculdades da mente, o espírito e todos os hábitos do espírito.

            Assim deve ter sucedido que tignum e culmen com toda propriedade significaram “travessinha” e “palha” no tempo das palhoças. Depois, com o polimento das cidades, significaram toda a matéria e o acabamento dos edifícios. Assim tectum pela “casa” toda, porque nos primeiros tempos uma cobertura valia por uma casa. Assim, puppis pela “nave”, porque, sendo elevada, será a primeira a ser divisada pelos que estão em terra; como nos tempos bárbaros recorrentes[3] se disse uma “vela” por uma “nave”. Assim, mucro[4] por “espada”, porque esta palavra abstrata, como um gênero, compreende pomo, talhe e ponta, sendo que eles sentiram pavor foi mesmo pelas pontas... Assim, a matéria pelo todo dela constituído, como “ferro” pela “espada”, pois não sabiam abstrair as formas da matéria[5]. Aquele nastro de sinédoque e de metonímia:

Tertia messis erat[6]

nasceu, sem dúvida, de uma necessidade natural, porque devem ter decorrido mais de mil anos para surgir entre as nações este vocábulo astronômico “ano”; assim como na zona rural florentina ainda dizem abbiamo tante volte mietuto[7] para significar “tantos anos”. E aquele grupo de duas sinédoques e de uma metonímia:

Post alíquota, mea regna videns, mirabor, artistas[8]

em muito acusa a infelicidade dos primeiros tempos aldeões, nos quais, para expressar-se diziam “tantas espigas”, que são particulares mais das messes, para indicar “tantos anos”, e, porque a expressão era muito infeliz, os gramáticos ali supuseram muito de artístico.

 

4.

            A ironia certamente não pode começar senão nos tempos da reflexão, porque ela forma-se a partir do falso, em virtude de uma reflexão que assume máscara de verdade. Aqui nasce um grande princípio de coisas humanas, que confirma a origem da poesia aqui inventada: que os primeiros homens da gentilidade tendo sido tão simplórios quanto as crianças, que por natureza são verazes, as primeiras fábulas não puderam fingir nada de falso. E terão sido, necessariamente, como acima as definimos, narrativas verdadeiras.

 

5.

            Por todas essas razões se demonstrou que todos os tropos (que ao todo se reduzem a estes quatro)[9], até hoje tidos em conta de engenhosíssimo inventos dos escritores, corresponderam a necessaríssimos modos de expressarem-se todas as primeiras nações poéticas, guardando, em sua origem, toda a sua nativa propriedade. Depois, no entanto, com o progressivo desenvolver-se da mente humana, inventaram-se as palavras que significam formas abstratas, ou gêneros que compreendiam as suas espécies, ou que compunham com suas partes as integralidades, passando tais falares das nações primitivas a transportes. E aqui começam a esboroar-se aqueles dois erros comuns dos gramáticos: ser próprio o falar dos prosadores, e, improprio o dos poetas; que primeiro existiu o falar em prosa, e, depois o do verso.



[1] Nota Flora que só então elas se converteram em metáforas, pois, antes, nos tempos poéticos, constituíam um só corpo com a poesia, já que não nascera ainda a abstração filosófica. (N. do T.)
[2]
[3] Isto é, a Idade Média. Recorde-se que Vico apregoa uma reiteração cíclica dos tempos históricos. E sua teoria dos corsi e ricorsi. (N. do T.)
[4] Ponta, extremidade pontuda.
[5] Sua continuidade.
[6] Era já tempo da terceira ceifa. (N. do T.)
[7] Colhemos já tantas vezes. (N. do T.)
[8] Vergílio, Bucolica, I, 69, na forma interrogativa, diz Melibeu: Poderei ainda um dia rever meus campos... E, ao rever aquilo que foi meu domínio, será que não irei deparar, com doloroso espanto, apenas algumas espigas?
[9] Metáfora, metonímia, sinédoque e ironia. (N. do T.)